Eva e Maria constituem os dois polos da beleza feminina na Idade Média. Essa oposição exprime a tensão que existe no próprio coração da imagem da mulher. De um lado, existe Eva, a tentadora e, mais particularmente, a pecadora, que provém de uma leitura sexuada do pecado original. Mas, ao mesmo tempo, a Idade Média não esqueceu que o Deus do Gênesis criou a mulher para que ela fosse a companheira do homem, a fim de não deixá-lo só. Eva representa, assim, essa auxiliar do homem que lhe é necessária. Por outro lado, a Eva da criação e de antes do pecado original está nua, aliás, como Adão. E a arte medieval, de que o casal da criação será um dos grandes temas, introduz o nu feminino na sensibilidade da época.
É por meio dessa referência paradisíaca, dessa presença da nudez, dessa psicologia da tentação, que a Idade Média descobre a beleza feminina.
(...) Eva é uma das encarnações da beleza que leva a Idade Média à descoberta do corpo e, sobretudo, do rosto feminino, presente em numerosos retratos.
Diante de Eva, Maria aparece como a redentora. É a beleza sagrada diante da beleza profana. E a beleza feminina é feita do encontro dessas duas belezas. Mas se o corpo de Maria não é objeto de admiração, seu rosto, o é. E é o duplo rosto da mulher Eva e da mulher Maria que produz essa promoção do rosto feminino, que se impõe principalmente a partir do fim da Idade Média, no século XIII, com o gótico.
LE GOFF, J.; TRUONG, N. Uma história do corpo na Idade Média. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2006, p. 142-143.
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