quinta-feira, 6 de outubro de 2011

A beleza feminina entre Eva e Maria

Eva  e  Maria  constituem  os  dois  polos  da  beleza  feminina  na  Idade Média.  Essa  oposição  exprime  a  tensão  que  existe  no  próprio  coração  da imagem  da  mulher.  De  um  lado,  existe  Eva,  a  tentadora  e,  mais particularmente, a pecadora, que provém de uma leitura sexuada do pecado original. Mas, ao mesmo tempo, a Idade Média não esqueceu que o Deus do Gênesis criou a mulher para que ela fosse a companheira do homem, a fim de não deixá-lo só. Eva representa, assim, essa auxiliar do homem que lhe é necessária. Por outro lado, a Eva da criação e de antes do pecado original está nua, aliás, como Adão. E a arte medieval, de que o casal da criação será um dos grandes temas, introduz o nu feminino na sensibilidade da época.
 
É  por meio  dessa  referência paradisíaca, dessa presença da nudez, dessa psicologia da tentação, que a Idade Média descobre a beleza feminina.
 
(...)  Eva  é  uma  das  encarnações  da  beleza  que  leva  a  Idade  Média  à descoberta do corpo e, sobretudo, do rosto feminino, presente em numerosos retratos.
 
Diante de Eva, Maria aparece como a redentora. É a beleza sagrada diante da beleza profana. E a beleza feminina é feita do encontro dessas duas belezas. Mas se o corpo de Maria não é objeto de admiração, seu rosto, o é. E é o duplo rosto da mulher Eva e da mulher Maria que produz essa promoção do rosto feminino, que se impõe principalmente a partir do fim da Idade Média, no século XIII, com o gótico.

LE GOFF, J.; TRUONG, N. Uma história do corpo na Idade Média. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2006, p. 142-143.

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